XIV ENCONTRO
HOSPITALERAS E HOSPITALEROS
CAMIÑO PORTUGUÉS
PONTEVEDRA
19 DE SEPTIEMBRE 2015
HOTEL GALICIA PALACE
O Caminho Português de Peregrinação a Santiago de Compostela representa o contributo português para a mais célebre peregrinação da Europa Ocidental.
Beneficiando da proximidade física em relação a Compostela, e da densa rede viária do Noroeste peninsular, o Caminho Português contrasta com os demais, na medida em que oferece itinerários diversificados e de mais fácil caminhada (evitando, por exemplo, os percursos mais expostos ao Sol e ao calor e, em tempos mais recentes, a massificação de alguns itinerários).
O impacto da descoberta em Compostela do túmulo do Apóstolo (ocorrida pela década de 20 do século IX) antecedeu a independência de Portugal e o mais antigo testemunho no atual território nacional deverá datar de 862 (menos de meio século após aquela descoberta), ano em que foi sagrada a Igreja de Santiago do Castelo de Neiva (concelho de Viana do Castelo).
Ao longo da Idade Média, os caminhos portugueses foram procurados por peregrinos jacobeus nacionais e estrangeiros, que deixaram numerosos registos e relatos, conservando-se ainda, e sobretudo, uma herança documental original que menciona legados pios para construções públicas que beneficiavam os peregrinos.
Foi o que ocorreu com S. Gonçalo de Amarante, lendário construtor da ponte medieval sobre o rio Tâmega naquela localidade, cuja legenda ombreia com Santo Domingo de la Calzada ou San Juan de Ortega (pontos do Caminho Francês já declarados Património Mundial).
Se o Norte do país conserva ainda muitos dos antigos caminhos de peregrinação (particularmente a Norte do rio Douro), o sul de Portugal teve uma estruturante presença da Ordem de Santiago, principal instituição que, no século XIII, empreendeu a conquista do Alentejo e Algarve e deteve a gestão de grande parte daqueles territórios nos séculos seguintes.
Por essa razão, é surpreendente a densidade de marcas alusivas ao culto a Santiago, razão de ser de uma dimensão verdadeiramente nacional do culto do Apóstolo em Portugal (que alia assim a herança peregrinatória do Norte ao impulso conquistador e reformador do Sul).
Na atualidade, os Caminhos Portugueses de Peregrinação a Compostela representam, aproximadamente, 20% do fluxo anual de peregrinos registado na Oficina do Peregrino de Santiago de Compostela (18,60% em Maio de 2015) e a tendência dos últimos anos tem sido a de um contínuo aumento, especialmente nos meses de Primavera e Outono.
Existem 4 caminhos estabelecidos:
1.Caminho Central Português: percorre c. 634 Kms, entre Lisboa e Santiago de Compostela (dos quais 569 Kms em território português).
É o itinerário estruturante, que se inicia na capital do país, onde existe a igreja paroquial de Santiago (cuja freguesia já está documentada em 1160), a Sé-Catedral (que detém uma dimensão peregrinatória medieval testemunhada pelo culto a S. Vicente), o Museu Nacional de Arte Antiga (maior repositório de arte dedicada a Santiago do país, ali se conservando, entre outras peças referenciais, o retábulo da Vida e da Ordem de Santiago), o Mosteiro dos Jerónimos, tão ligado à figura de D. Manuel I (1469-1521) e à peregrinação que empreendeu a Compostela em 1502.
As etapas principais deste trajecto incluem Coimbra (onde se encontra o túmulo e o tesouro de D. Isabel de Aragão (1271-1336) – no Mosteiro de Santa Clara-a-Nova e no Museu Nacional de Machado de Castro, respectivamente), Porto (principal ponto de partida dos peregrinos actuais dos caminhos portugueses e cidade que preserva ainda importantes testemunhos do culto a Santiago, seja na sua Sé Catedral, seja na mais modesta igreja de S. Crispim e S. Crispiniano, antigo hospital dos Palmeiros) e Barcelos (em cujo museu arqueológico se encontra o Cruzeiro do Senhor Galo, cuja lenda é idêntica à de Santo Domingo de la Calzada).
O percurso integra ainda a passagem por Valença do Minho, principal ponto de passagem para Tui, e onde se concentraram abundantes albergarias e hospitais desde a Idade Média
2.Caminho Português da Costa: numa extensão de c.142 Kms, este trajecto é uma derivação do Caminho Central Português, a partir do Porto ou a partir de S. Pedro de Rates.
Este itinerário justifica-se pelos abundantes testemunhos do culto a Santiago e da passagem dos peregrinos nas localidades marítimas do Norte português, sendo o atual concelho de Matosinhos um dos casos mais significativos (sobretudo a lenda do barco de pedra que evoca um acontecimento ocorrido no mesmo momento em que a barca com o corpo de Santiago passava ao largo da costa rumo à Galiza).
Vila do Conde e, especialmente, Viana do Castelo foram importantes pontos de passagem de peregrinos, restando, nesta última cidade, o Hospital Velho, destinado a pelegrijs e rromeus que vãa.o e veem pera Santiago (informação de 1459).
A travessia para a Galiza pode fazer-se por barco através de Caminha e Vila Nova de Cerveira ou, por terra, atravessando a ponte em Valença do Minho, aí entroncando com o Caminho Central Português.
3.Caminho Português Interior de Santiago: numa extensão de 307 Kms (160 Kms dos quais em território português), este caminho liga Viseu à fronteira com a Galiza, em Verín, e estrutura-se em 10 etapas.
É o itinerário de peregrinação a Compostela que inclui maior componente de paisagem natural, a par de algumas importantes referências patrimoniais: em Viseu, o Museu Nacional de Grão Vasco inclui o retábulo dedicado a Santiago, procedente da Igreja de Santiago de Cassurrães, e obra cimeira do pintor manuelino-renascentista (Grão) Vasco Fernandes; o centro histórico de Lamego; a ponte medieval de Oura; e o núcleo urbano de Chaves, última paragem antes da Galiza e, por isso, terra de importantes albergarias medievais
4.Caminho de Torres: Com início em Salamanca, 343 Kms deste caminho são percorridos em território português. A sua importância é semelhante ao Caminho Central Português, uma vez que é através deste itinerário que se incluem nos trajectos de peregrinação a Compostela três das cidades que possuem mais numerosos e relevantes testemunhos do culto a Santiago: Amarante (cuja ponte e mosteiro estão consagrados a S. Gonçalo, lendário beneficiador do caminho para os peregrinos), Guimarães (onde se testemunha o primeiro hospital para peregrinos, logo no século X) e Braga (cuja catedral românica, no século XI, pretendeu constituir-se como centro de peregrinação rival de Compostela).
Entronca no Caminho Central Português em Ponte de Lima e deve o seu nome ao itinerário percorrido entre 1732 e 1734 por Diego Torres, catedrático da Universidade de Salamanca exilado em Portugal por esses anos.
5. Caminho Nascente Português: ao longo de 535 Kms, entre Tavira e Trancoso, onde entronca no Caminho de Torres, este itinerário ilustra diferentes dimensões do culto a Santiago no Sul e interior do país. Começa em Tavira, cidade emblemática para a Ordem de Santiago, onde subsiste o túmulo de Paio Peres Correia (c.1205-1275) - o mais importante mestre medieval da Ordem.
As etapas incluem passagens por Mértola (uma das três capitais da Ordem de Santiago em Portugal), Beja (cuja igreja de Santiago foi elevada a catedral) e Évora (onde o herói da reconquista da cidade, Geraldo Sem Pavor, foi representado com as vieiras de Santiago e onde existe também a igreja de Santiago).
O percurso segue depois para o Alto Alentejo e Beira Baixa, onde o caminho já se encontra marcado e onde subsistem importantes elementos de devoção ao apóstolo, como a Igreja de Santiago de Belmonte (local que acolhe o túmulo do descobridor do Brasil, Pedro Álvares Cabral (c. 1467-1520).
A opção por Trancoso como ponto de chegada justifica-se pelo cruzamento do Caminho de Torres e por a vila ser um importante local de passagem de peregrinos, cuja etapa mais antiga do castelo (século X) foi mencionada num documento de 960, pelo qual uma célebre nobre doou este e outros bens ao mosteiro de Guimarães pro remedio animo nostre captiuos et peregrinos et monasteria (para salvação da nossa alma, captivos, peregrinos e mosteiros).
O Caminho Português de Santiago, nos seus itinerários, contribuiu para a identidade europeia, assente na mobilidade medieval e no intercâmbio entre várias dimensões que caracterizam a aventura humana, desde a arte à literatura, da religiosidade popular à assistência aos peregrinos, da etnografia e arqueologia à sociologia.
MAPA
Fuente: ASSOCIAÇÃO ESPAÇO JACOBEUS
XOAN ARCO DA VELLA